Capitulo 4 Versiculo 3

Racionais Mcs
Minha intenção é ruim,
esvazia o lugar.
Eu tô em cima, eu tô afim:
1,2 pra atirar.
Eu sou bem pior do que vocíª tá vendo,
preto aqui ão tem dó, é 100% veneno.
A primeira faz bum, a segunda faz tá.
Eu tenho uma missão e ão vou parar.
Meu estilo é pesado e faz tremer o chão,
minha palavra vale um tiro
eu tenho muita munição.
Me aquietam na sessão,minha atitude vai além,
e tem disposição pro mal e pro bem.
Talvez eu seja um sádico,
um anjo, um mágico,
ou juiz ou réu,
um bandido do céu,
malandro ou otário,
quase sanguinário, franco atirador (se for necessário),
revolucionário, insano ou marginal,
antigo e moderno, imortal,
fronteira do céu ou inferno
astral imprevisí­vel, como um ataque cardí­aco
do verso, violentamente pací­fico, verí­dico,
vim pra sabotar seu raciocí­nio,
vim pra abalar o seu sistema nervoso e sanguí­neo.
Pra mim ainda é pouco dá cachorro louco,
íºmero 1, guia, terrorista de periferia.
Uni, duni, tíª. Eu tenho pra vocíª:
Um rap venenoso ou uma rajada de PT?
E a profecia se fez como previsto:
1997 depois de Cristo.
A fíºria negra ressucita outra vez:
Racionais Capí­tulo 4, Versí­culo 3.
Olá filhas da puta, Pá pá.
Faz frio em São Paulo pra mim tá sempre bom:
eu tô na rua de bombeta e moleton,
dindindon rap é o som que emana dum opala marrom.
E aí­? Chama o Guilherme, chama o Bane, chama o Dinho,
e o Kim, Marquinho, chama o Eder vamo aí­,
se os outros manos vem, pela ordem tudo bem,
melhor, quem é quem no bilhar no dominó.
Colou dois mano um acenou pra mim,
de jaco de cetim, de tíªnis calça jeans.
Ei Brown, sai fora, nem vai, nem cola,
ão vale a pena dá idéia pra esse tipo aí­:
ontem a noite eu ví­ na beira do asfalto,
tragando a morte, soprando a vida pro alto.
í“ os cara só o pó, pele e osso,
no fundo do poço, mais flagrante no bolso.
Veja bem ninguém é mais que ninguém,
veja bem, veja bem,
eles são nossos irmãos também.
Mas de cocaina e crack, wisky e conhaque,
os mano morre rapidinho sem um lugar de destaque.
Mas quem sou eu pra falar
de quem cheira ou quem fuma? Nem dá!
Nunca te dei porra nenhuma.
Vocíª fuma o que vem, entope o nariz,
bebe tudo que tem, faça o diabo feliz.
Vocíª vai terminar, tipo o outro mano lá,
que era um preto tipo A,
ninguém entrava numas. Mó estilo:
de calça Calvin Klein, tíªnis Puma.
Um jeito humilde de ser, no trampo e no rolíª.
Curtia um funk, jogava uma bola,
buscava a preta dele no portão da escola.
exemplo pra ós, mó moral, mó ibope.
Mas começou colar com uns branquinhos no shopping. Ih mano!
Outra vida, outro pique, só mina de elite,
balada, vários drinks, puta de boutique,
toda aquela porra, sexo sem limite, Sodoma e Gomorra.
Faz uns nove anos,
tem uns 15 dias atraz eu vi o mano,
se tem que ver,pedindo cigarro
pros tiozinho no ponto, dente tudo zuado,
o bolso sem nem um conto.
O cara cheira mal, azia senti mesmo!
muito louco de sei lá o que, logo cedo.
Agora ão oferece mais perigo: viciado, doente,
fudido: inofensivo.
Um dia um PM negro veio embaçar
e disse pra eu me por no meu lugar.
Eu vejo um mano nessas condiçíµes, ão dá!
Será assim que eu deveria estar?
Irmão o demônio fode tudo ao seu redor,
pelo rádio, jornal,
revista e outdoor.
Te oferece dinheiro,
conversa com calma,
contamina seu caráter, rouba sua alma.
Depois te joga na merda sozinho,
transforma um preto tipo A num neguinho.
Minha palavra alivia sua dor, ilumina minha alma,
louvado seja o meu Senhor.
Que ão deixa o mano aqui desandar,
ah nem sentar o dedo em nenhum pilantra.
Mas que nenhum filha da puta ignore a minha lei:
Racionais capí­tulo 4, versí­culo 3.
Olá filhas da puta Pá pá.
Quatro minutos se passaram e ninguém viu,
o monstro que nasceu em algum lugar do Brasil.
Talvez o mano que trampa debaixo do carro sujo de óleo,
que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhos,
o mano que entrega envelope o dia inteiro no sol,
ou o que vende chocolate de farol em farol,
talvez o cara que defende o pobre no tribunal,
ou que procura vida nova na condicional,
alguém no quarto de madeira, lendo í  luz de velas,
ouvindo rádio velho no fundo de uma cela,
ou um da famí­lia real de negros como eu sou,
um prí­ncipe guerreiro que defende o gol.
E eu ão mudo mas eu ão me iludo
os mano cu-de-burro (tem) eu sei de tudo.
Em troca de dinheiro e um cargo bom.
Tem mano que rebola e usa até batom.
Varios partidos falam merda
pra todo mundo ouvir,
ah ah pra ver branquinho aplaudir.
í‰ na sua sua área tem fulano até pior,
cada um cada um, vocíª se sente só.
Tem mano que te aponta um pistola e fala sério:
explode sua cara por um toca fitas velho.
Clic! plau! plau! plau! e acabou
sem dó e sem dor, foda-se sua cor,
Limpa o sangue com a camisa e manda se fuder!
Vocé sabe por que, pra onde vai, pra quem vai.
De bar em bar, de esquina em esquina,
pegar 50 contos, trocar por cocaina.
Enfim, o filme acabou pra vocíª:
a bala ão é de festim, aqui ão tem dublíª.
Para os manos da Baixada Fluminense í  Ceilandia,
eu sei, as ruas ão são como a Disneylandia.
De Guaianazes ao extremo sul de Santo Amaro:
ser um preto tipo A custa caro. í‰ foda!
Foda é assistir a propaganda e ver:
ão dá pra ter aquilo pra vocíª.
Playboy, folgado, de brinco, uns trouxa.
Roubado dentro do carro na av. Rebouças.
Correntinha das moças. Madame de bolsa.
Dinheiro. Não tive pai, ão sou herdeiro.
Se eu fosse aquele cara que se humilha no sinal,
por menos de um real, minha chance era pouca,
mas se eu fosse aquele moleque de touca,
que engatilha e enfia o cano dentro da sua boca.
De quebrada, sem roupa. Vocíª e sua mina.
Um, dois, nem me viu! Já sumi na neblina.
Mas ão! Permaneço vivo, eu sigo a mí­stica,
27 anos contrariando a estatí­stica.
Seu comercial de TV ão me engana,
eu ão preciso de status, nem fama.
Seu carro e sua grana já ão me seduz
e nem a sua puta de olhos azuis.
Eu sou apenas um rapaz latino americano
apoiado por mais de 50 mil manos.
Efeito colateral que o seu sistema fez:
Racionais capí­tulo 4, versí­culo 3.